quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Olha, a noiva!




A noiva vai fugir com samba,
Olha lá, eu posso ver ela no altar.
Com as mãos cruzadas, fingindo rezar,
Mas ela vai fugir, você verá.
Olha lá, ela fingindo que vai beijar,
Mas é tudo mentira, espere um pouco que fugirá.
Olha ela saindo da igreja, deixando o altar,
Mas ainda vai embora e nem vai ligar.
Ih, olha o noivo sozinho, triste a chorar,
Sua noiva foi embora e ele chora para ela voltar.
Eu bem que avisei, que até o fim da cerimônia não ia durar,
Moça criada em roda de samba, só casa com partideiro e se for para sambar.

terça-feira, 21 de junho de 2011

altura.


Se para o homem faltava asas, agora é como se completo estivesse. O ápice da evolução da espécie:com razão, corpo fortalecido e asas.
O céu, o glorioso céu, onde ilustram o nosso paraíso, entre nuvens de algodão doce e o antigo templo de Zeus, agora rota das asas do homem.

Lembro a primeira vez que subi num avião, a caminho de Espírito Santo, lembro que tinha 11 anos e lembro também que parecia imortal. De cima via pontos que poderiam ser cabeças, árvores ou o tanto faz , se perdiam entre o verde, o azul, o amarelo e o arco íris de coisas não identificadas. Queria abraçar todas as miniaturas, eu ali tão pequena, parecia gigante entre todas as paisagens que iam perdendo nitidez a cada cenário novo. Eu poderia ali ser mais que o presidente da república, mais que todos os reis da monarquia antiga e mais que qualquer título de realeza, eu estava no céu, onde somente os anjos poderiam me alcançar.

Enquanto me aproximava da terra, lembro de imaginar o avião se perdendo e sem achar o caminho de volta, eu ficara ali, voando entre meus sonhos e o suco de laranja.
Quando pisei em terra firme, diminui de novo, parecia a mesma criança que havia entrado pelas portas daquele avião, mas não, era outra, havia deixado parte de mim ao lado do piloto na cabine e a outra parte perdida entre a claridade e a neblina.

"Uma vez tendo experimentado voar, caminharás para sempre sobre a Terra de olhos postos no Céu, pois é para lá que tencionas voltar."
Leonardo da Vinci

domingo, 3 de abril de 2011

Como Van Gogh...


De frente para o espelho. Gordo, careca e frustrado.
Seria um famoso pintor?

Durante anos estudou artes numa faculdade reconhecida, aprendeu diferentes idiomas e conheceu toda influência, que de fato era necessária.

Hoje vende carros usados, numa concessionária sem nome.Acorda todo o dia às 5, mal consegue abrir os olhos e já tem roupa para passar e já tem criança para cuidar...

De frente para o espelho, gordo, careca e frustrado, sua mulher deitada na cama, já com sinais de idade, aquela menina de cabelos longos e de riso largo, agora uma mulher amarga e infeliz, nota parte da barriga que pula. Sussurra:
- Poderia correr, ao menos...

Um silêncio no quarto. Um silêncio. Sem palavras.
Naquele minuto em que a gravata sufoca o resto de dignidade, pensa no que seria o fruto da sua vida vazia. Filhos barulhentos? Mulher insatisfeita? Pneus furados? E o silêncio continua.


Um quadro ficou jogado, entre poeira de quartinho escuro e baratas elétricas. Um quadro que um dia era um sonho, agora o único vestígio de humanidade dentro de uma família.

Chegou no trabalho, pegou um papel, fez um rabisco, pegou uma arma e pintou de sangue a última tela de sua vida. Morreu.

sexta-feira, 18 de março de 2011

tem pô favô.



Sou eu o seu verbo o seu adjetivo, sou o que você modifica, tudo que no final, você transforma em cinzas, pó. Afinal eu posso, agora ou amanhã, quem sabe em breve, bem cedo,imediatamente ou jamais, dizer que você passou, ou que eu passei, que sou dona sua ou que você é dono meu, meu ou nosso? Quem sabe da geração ou quem sabe de ninguém. E desta forma confusa, conflitante, tempofavô fique, não vá ou pode ir, corre logo, bem devagar,viu?


E às vezes, na tarde,na noite ou na manhã, de repente, de vez em quando, de quando em quando, a qualquer momento, eu possa te sentir como areia pelos dedos, em minha retina em minha epiderme.


Não seja cruel comigo, ok? Seja bonzinho.

Tem pofavô.

terça-feira, 1 de março de 2011

homme.


Custou-me tanto:
Com tempo, com pranto.
Nada me pediu.
Mas é meu, meu e só meu.

Sem heroísmo de romance,
Com a palidez de inverno.
Na sua força bruta sútil.
Eu gosto assim, eu gosto sim.

No tom e desafinado,
Na lama jogado,
Falante ou acuado,
Mas eu o amo, amo.

O meu homem sempre vou amar.
Talvez nunca saiba, talvez até duvide,
Não me importo.
Em seus braços, sou só.

E do que adianda adeus?
Levantar e arrumar bolsa, roupa e maquiagem
Eu volto, volto com o orgulho na coleira
Volto correndo, volto de joelhos e volto.

Para qualquer coisa que seja,
Homem meu, serei sempre sua mulher.

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Nossa paixão era inventar um novo tempo.

É complicado não pensar na vida como uma grande coincidência, mesmo para os mais cegos ímpios.
Eu gosto de pensar que pessoas, coisas, lugares e até mesmo o tempo é que desenvolvem o papel de me estremar. Nesta perspectiva, eu consigo entender porque dentro de uma livraria com mais de 3.000 livros, eu consegui escolher o livro de Daniel Souza e de Gilmar Chaves.

A capa azul e salmão, as páginas pálidas, amareladas de velhas, algumas até rasgadas e o preço barganhado pela senhora minha mãe, não correspondem, de fato, as 191 páginas de emoção que o livro traz. Eu devorei o livro em um dia, e olha que tem muito tempo que minha cabeça não largava Gilmar Mendes, Hely Lopes, Cavalieri Filho, Rogério Greco e companhia, para uma literatura sem artigos e princípios legais. O livro começa com uma citação de um homem que eu passei a ter uma profunda admiração, Oscar Niemeyer, isso talvez tenha chamado minha atenção para a compra do livro, após esta maravilhosa apresentação, encontramos, como a própria capa do livro diz, 34 depoimentos de personalidades sobre a resistência à ditadura militar. Tá, eu sei o que você está pensando, DITADURA MILITAR? FILME DA GLOBO, DOCUMENTÁRIO DA GLOBO, NOVELA DA GLOBO, MINISSÉRIE DA GLOBO... Livros, mídia, propaganda, revistas e matérias no Discovery Channel, resumindo o seu pensamento, é claro. Mas sinceramente, eu posso dizer que não, não pensei em nada disso quando eu li o livro.

O segundo depoimento foi talvez o mais marcante para mim, Adilio Athos, que a nível de conhecimento (google), não passa de um "personagem" deste livro, é a primeira referência que aparece. Logo em seguida, o que me deixou confusa, aparece este mesmo nome como uma pessoa responsável de um cenário em uma peça de teatro. Como o nome é bem incomum, acredito que seja a mesma pessoa, ou espero que seja. Adilio Athos é talvez ainda um ponto de interrogação para mim, porque em seu depoimento ele não narrou quem de fato ele era, ou sua verdadeira história e caminhada, narrou de forma linda e em poesia sua trajetória até o fim de sua tortura. De forma brilhante e com rimas ricas, a passagem se torna emocionante em cada estrofe, não pela forma apenas, mas por trocadilhos, irônias e tudo muito bem elaborado. E eu não sei como Adilio Athos era fisicamente, mas de fato a minha imaginação construiu um homem alto, branco, magro, com um nariz grande, olhos claros e um ar de alegria eterna.

O livro conta com algumas figurinhas douradas da história brasileira como Luiz Carlos Prestes Filho, Regina Sodré e Jean Marc Von Der Weid, Pedro Viegas, Fernando Gabeira...

Além da crítica massante a Lei da Anistia de 79, os depoimentos tornam não somente o sofrimento destas pessoas de forma clara, como o vazio que ficou a vida e o pensamento com a geração perdida.

Não quero fazer apologia à educação, à luta por ideais ou talvez dar uma nova crença a nossa pátria, a história ensina que nacionalismo bom, é nacionalismo modesto. O que eu quero é divulgar a obra desta dupla dinâmica, que merece um novo olhar sobre este tema tão comum entre as provas de vestibular e tão incomum na mesa de jantar.

ps: Billie Holiday teve que me desculpar, tive que escolher entre sua coletânea e o livro.

"A casta vestida de verde dizia que eu estava livre, com tutela vigiada.
Pra não me perderem de vista, virei carta marcada.
Anistia, para quem não sabe, é pecado perdoado.
Pequei por ser contra um regime cruel e malvado.
Essa coisa chamada de anistia foi feita em prol da direita e dos senhores da vilania.
Onde estão os meus direitos, que até hoje procuro?
Quanto mais eu peço luz, mais fico no escuro..."

Adilio Athos